name:
Orongo Cattle Station
origin:
Nova Zelândia
“Não posso imaginar um trabalho mais satisfatório do que operar entre agricultura, história cultural, história ecológica e pré-história ecológica” - Thomas Woltz
A Estação de Orongo é uma fazenda costeira de 3.000 acres localizada na ilha do norte da Nova Zelândia. A fazenda já existia há mais de um século quando os atuais proprietários a assumiram em 2001. Naquele momento, devido ao excesso de pasto e ao desmatamento, extensas áreas da fazenda sofriam com a erosão do solo, e a qualidade das terras de pastagem era ruim. Além disso, um grande pântano havia sido drenado, destruindo o habitat de muitos pássaros, insetos e outros animais selvagens. Em suma, os novos proprietários tinham nas mãos um desastre ecológico.
Vinte anos depois, vemos a Estação de Orongo mais produtiva do que nunca, com a criação de ovinos e bovinos e produção de frutas cítricas e produtos de madeira por meio de um sistema de agricultura integrado.
A restauração da fazenda se deu por meio de um processo de design consciente, liderado pelo arquiteto paisagista Nelson Byrd Woltz. No centro da empreitada, estava o desejo de integrar três camadas: a paisagem agrícola, a paisagem cultural e a restauração ecológica da terra.
Resultado: hoje, a fazenda é financeiramente lucrativa e resiliente, os Maoris locais têm maior acesso à terra e um de seus antigos cemitérios foi ampliado. O resultado mais notável é que quase um quinto da terra foi "aposentado" para abrigar zonas de vida selvagem, incluindo a criação de um nicho ecológico para um dos répteis mais raros da Nova Zelândia, o lagarto tuatara.
Por que esse é um exemplo de economia circular
O modo de produção agrícola predominante nos últimos cem anos é um modelo industrial caracterizado pelo uso intensivo de produtos químicos e pelo manejo agressivo dos solos. Durante anos, esse modo extrativo levou a um aumento da produtividade agrícola, mas o legado de longo prazo tem sido a degradação gradual dos sistemas naturais. De acordo com um estudo da ONU de 2017, até um terço do solo do planeta está hoje gravemente degradado como resultado principalmente da agricultura intensiva. A degradação do solo também leva à destruição do habitat, de modo que a produção de alimentos também é o principal fator contribuinte para o colapso da biodiversidade.
Em paralelo à destruição do solo e da vida selvagem, a população mundial aumenta – e com ela a demanda por alimentos. Estima-se que, para alimentar os 3 bilhões a mais de pessoas que teremos em 2050, será necessária uma área com aproximadamente o dobro do tamanho da Índia. Para evitar a expansão para as áreas selvagens virgens, e proteger tanto os habitats da vida selvagem quanto ecossistemas que operam como sumidouros de carbono, precisamos encontrar maneiras de revitalizar as terras agrícolas existentes.
Felizmente, existem métodos alternativos de produzir alimentos e manejar as terras, o que significa que a agricultura pode ser uma solução – e não apenas reverter a degradação, mas tornando-se positiva para a natureza. A restauração da Estação de Gado de Orongo, antes uma área degradada, é um desses exemplos. A experiência na Nova Zelândia mostra que a agricultura não precisa ser um jogo de soma zero. Ao contrário: a produtividade agrícola, o sequestro de carbono, a prosperidade da vida selvagem e as tradições culturais podem existir juntas.
Como a Estação de Orongo foi restaurada
A partir da articulação de três camadas importantes – fazenda, cultura e ecologia –, foi aplicado um pensamento holístico ao sistema, a fim de reunir as complexidades do local em um todo integrado e coerente.
O desenvolvimento do plano diretor da futura fazenda contou com pesquisas sobre os mais variados aspectos da terra, cultura e atividades agrícolas, como lençóis freáticos, ciclos de inundação, plantas nativas, métodos de colheita, história cultural e hábitos das aves migratórias. Todos esses fatores serviram para definir o layout final da fazenda.
Alguns exemplos de fatores que influenciaram o design:
Um pântano de 200 hectares foi drenado, criando um terreno lamacento durante a estação chuvosa, inadequado para pastagem. A restauração ecológica exigiu o restabelecimento do pântano com uma série de passagens, lagoas e pólderes. As barragens em forma de S permitiram a separação entre a água doce e a água salgada para melhorar os habitats e a diversidade da vida selvagem.
Uma espécie de ave migratória necessitava de um mínimo de 1,6 hectare, pelo que o plano para o pântano incluía ilhas deste tamanho.
Espécies invasoras, como arminhos, doninhas e ratos, estavam fora de controle, comendo os ovos de aves escavadoras e ameaçando o equilíbrio ecológico. Para resolver o problema, foram feitas encostas de forrageamento mais íngremes, proporcionando um mirante mais seguro a certas espécies.
Um importante cemitério Maori, localizado nas terras da fazenda há mais de 300 anos, foi respeitosamente incorporado ao plano.
Uma obra de arte a serviço da vida selvagem
O arquiteto responsável pelo projeto, Thomas Woltz, vê as paisagens como telas. No caso da Estação de Orongo, o plano diretor final da fazenda assemelhava-se a uma pintura abstrata com fatores mensuráveis, como ilhas de habitat, cemitérios, encostas protetoras e raios de giro de máquinas como pontos fixos na composição.
Se a terra é uma tela, então seu plano de fundo são as 600 mil árvores plantadas como base para a jornada de restauração da fazenda. A vegetação natural da região é de floresta temperada, mas, à medida que a operação da fazenda se desenvolveu, a maioria das árvores foi cortada. Para viabilizar a arborização em escala, o plano incentivava o povo Maori da região a coletar sementes de florestas locais, que seriam então reproduzidas em um viveiro e vendidas de volta à fazenda. Agora que a restauração da fazenda foi concluída, o acesso dos Maori à terra foi ampliado para colheita, pesca e outras atividades tradicionais.
As árvores fornecem serviços ecossistêmicos valiosos, como madeira para construção, alimento para espécies polinizadoras, prevenção da erosão do solo, barreiras protetoras para os pomares de frutas cítricas e a criação de um habitat florestal funcional para uma espécie réptil de milhões de anos.
Uma nova casa para um dinossauro
Antes de 1300, não havia populações significativas de mamíferos na Nova Zelândia. Isso permitiu que as espécies de aves e répteis nativos prosperassem. A chegada dos humanos, primeiro com os Maoris e depois com os europeus, trouxe espécies invasoras e culminou na destruição do habitat. Muitas espécies foram extintas, particularmente as terrestres, como o moa, que não tinha evoluído para se defender contra o influxo de arminhos, doninhas e ratos predadores.
Um dos animais que mais sofreu é o lagarto tuatara (Sphenodon punctatus), uma antiga espécie réptil inalterada por mais de 200 milhões de anos. O habitat natural dos tuataras atualmente está restrito a 32 ilhas periféricas, sem populações selvagens encontradas na Nova Zelândia continental. Duas ameaças que levaram ao declínio do tuatara foram a ação predatória do rato polinésio (Rattus exulans), que se alimenta de ovos de répteis, e a relação particular que o tuatara tem com algumas espécies de aves marinhas.
Para prosperar, os tuataras dependem de uma simbiose com algumas espécies específicas de aves marinhas – dois tipos de petrel e um tipo de pardela, nenhum dos quais foi visto na costa neozelandesa por pelo menos 100 anos. Os tuataras coexistem em harmonia com essas aves, pois podem reutilizar as tocas das aves para fazer seus próprios ninhos e eventualmente adquirir alimentos, comendo alguns ovos e os insetos que se alimentam do guano das aves.
Para fornecer um habitat adequado para o tuatara, uma área da fazenda contendo 80 mil árvores e uma borda íngreme de um penhasco foram cercados. Para encorajar o retorno dos pássaros marinhos, um alto-falante alimentado por energia solar foi colocado no penhasco emitindo os sons das espécies desejadas todas as noites, de modo que uma colônia foi logo estabelecida. Depois de muitos anos de crescimento florestal e de pelo menos três ciclos de nidificação, a Autoridade da Vida Selvagem da Nova Zelândia e o grupo local de conservação Maori decidiram que o habitat estava adequado para maximizar a chance de reprodução bem-sucedida e, em 2012, 65 adultos tuataras foram introduzidos na área. Pouco tempo depois, os primeiros ovos de tuatara eclodiram com sucesso.
A decisão de lançar o tuatara nas terras da Estação de Orongo confirma a transformação bem-sucedida de uma paisagem degradada em uma das ecologias mais ricas e biodiversas da região. Para restaurar as vastas extensões de terra ao redor do mundo destruídas pela agricultura industrial, mais agricultores e proprietários de terras precisam seguir exemplos como esse, que se tornou uma fonte abundante de alimentos e referência de cultura e ecologia.